na esfera de tinta
em cada letra
se imprimem cem mil compósitos que
em cada letra
são pontos em movimento que
em cada letra
se inscrevem com quem escreve
em cada letra
no papel
como a vida
efémero
linhas tecidas à mão
cozidas no forno de pão
caseiras, sumidas
com fermento e pólvora
se explodem,
picantes,
na sinestésica visão
do leitor deliciado
quero imprimir-te os anos
e cem mil poemas na pele
desses olhos tatuados a preto
tintos, meu vinho, minha vida,
beber-te a delicadeza
suave suor
teus beijos de odor
menor meu cheiro, gustavo,
maior teu ser amado,
cercado
caneta-me de tinta permanente
palavra sentida, expressa,
meu café, meu cigarro, meu vício,
detonado
teus seios de amor
filia-me
nas arestas de dor
erotiza-me
cajado de carne
guia-me
no teu interior
sodomiza-me
o ego, a líbido, o córtex
mata-me, impede-me, suga-me
sorvete servido, sorvido
congelado, mantido
mantenho-me
rendido
venero a tua veia,
tua ceia,
vampiriza-me
crucifica o caracter
no teu ídolo majéstico
reinado de terror
governa-me
sanitário ditador
interna-me
na tua camisa de forças
aperta-me
com teu choque eléctrico
manipula
estes cordéis
tua oferenda, esta marioneta,
incerta
sensor infravermelho
carrega
a bateria, fraca,
deste aparelho viciado
mentor angélico
deste cigano diabo
arquétipo maior, aristotélico,
sem género
carnívoro predador
radicaliza-me
no teu oxigénio
em cada letra
do teu gene magnético