sábado

Da dexteridade

A besta animal ela mesma bem enquadrada
Reconhece o seu código mas detesta-lhe o uso
Corre move corre sorve chora dó grita sai destrói
Escreve em grifo a fim de devorar o santo mais expedito
Urra as palavras montras do sujo debaixo da plateia dos ogros
Sabe a terracota, furaca-se no susto da espiral de horrores todos
Não dou, não pastas, não caminhas em vale de sombras para alcançares
Mal aproveitados no seu sentido Cão, estésico, hipocrático, sufistado
O meu feno é úmeno, o meu gene é húmido, o meu onte é meu
Não ónus não provo não desejo não experimento não concedo
Ele mesmo bem perdido como pérfido qual rio industrial
Porque eu macumbei a ousada estupidez altérica
Histérica dos aparelhos estereofónicos roídos
Sou destra, mas não reconheço a idade

Que o meu cora só a mim a me pertence, não reconheço legitimidade ao oponente, eu sou o Gine e o pilar em seio das minhas próprias aquisições onde as manipulo e as distorço e as tomo, como se coma a vírgula viva de dentro para fora como nas porcas catapultadas no mármore ardo eu deixa-me estar não creias ter levado a mão mais alta, não creias que teres testado a minha ira seja a fuga em frente que o poder da minha ostensiva reparação sobre as hordas de cavaleiros vagos da bolachas e do rosa e do azul, relembrando as velhas vozes do pessimismo da carne pintadas por aquele nomeado como o filósofo donde saiam as larvas e donde caiam os dentes e onde as bestas devoram as estimas e os animais acorrentados pelo contrato que hei-de eu reconhecer há coisas bem mais terríveis que estar só, no sono dos inquietos que buscam a sua negação não te fies em mim para oscular a redenção onde a piedade e o amor devoto foram vociferados aberrantes dum bezerro ciclope.

Do nojo

Um dia acordei esputrefacta
Acreditei que com uma faca e um alicate
Pudesse cortar fora uma perna que não pertencia ali
Acreditei que com uma navalha e uma pinça
Pudesse retirar os seios que não eram dali
Acreditei que com fios de cobre e uma agulhas de crochet
Pudesse re-coser estes bocados de novo no corpo
Mas estava esputrefacta
Eu não sentia nada.
Tudo era pus.
Pus era podre.
Eu era uma gangrena, só cortável não cosível.
Certo é que sabia a razão.
Gostava de me injectar com botulinas vivas,
O simples e o bovino gritavam de patogenicidade,
Gostava de saber que a minha ira cuspia esmegma
O amável e o fóssil destilavam uma certa cropoporfiria
Nada ali era puro.
Puro não era limpo.
Límpido era real.
Real era uma pessoa decantada na dissolução do nojo,
Esse que as pessoas vestem negras por altura da morte.

quinta-feira

La Matter

As palavras-femininas
As âncoras-felinas
Os cantares-fêmea
Os corpos-poema
De mãos dadas o que são?

Um, hum, ano
não é a Humanidade?
um nato oral
não é a Natureza?
um feliz-Sr.contente
não é a Felicidade
um bom-bom
não é a Bondade?

O masculino-selado
Na imanente matéria montado
O feminino-cavalga
Na transcendência substanciado

Demagogias fáceis
Da Repartição das Mentalidades
Instituída por decreto
Da Divisão-Geral das Propriedades

Esta fêmea não quer ser cantada
Por um qualquer tom de Zé
Prefere saber-se e ser contemplada
Não definida pelo é nem pelo não é.

quarta-feira

Eu

Eu vou, eu vou, eu vou, eu vou ser o voo
Eu sou, eu sou, eu sou, eu Soho eu no sonho
Eu tenho, eu tenho, eu tenho, es tanho esta manha
Eu poderia, eu poderia, eu poderia, eu podria ser tamanha
Eu quisesse, eu quisesse, eu quisesse, eu quisesse ser uma outra cor
Eu voaria, eu voaria, eu voaria, eu voaria se eu fosse onde não Iria
Eu estaria, eu estaria, eu estaria, eu histeria se estivesse pia
Eu devo, eu devo, eu devo, eu devo se eu devesse ir vindo
Eu ego, eu ego, eu-ergo, eu-logo, eu-findo.

terça-feira

o barro

E lá vai o barro, nó de argilas:
Se o homem foi feito do barro,
de que foi feita a mulher?

do barro se faz, o barro se lança
o barro quebra, os pedaços muitos
do barro se retira, o barro se molha
o barro se molda, os pedaços fortuitos

da mulher se nasce, a mulher se corre
a mulher que quebra, pedaços incerta
da mulher que solta, a mulher se assusta
a mulher se encarna, os pedaços que liberta

Se eu pudesse responder
afinal, de que é ela feita
teria que saber um tanto de um tudo
despercebendo um pouco de todo o resto
e ai deixaria de saber o que as vísceras me pediam.

segunda-feira

o menino-macho

o menino-macho
faz bichos de 7 cabeças
é um chico buarque sem Holanda
tem uma cabeça de pregos
uma língua de trombetas
uma jangada cheia de pedras
agarra-se às saias da mãe
quando se vê livre
emancipa-se quando se vê
cercado delas
toma o dito por não dito
escreve quadrados
em linhas redondas
acha muito sem saber pouco
e que quanto mais se sabe
mais se ignora, o descampado
não tem tempo a perder
embora ache que anda solto nele
desagrega os quadrantes da carne
achando-se no poder da bactéria
vem com os trópicos cancerosos
num Verão de fogos colocados
ao comando duma qualquer rodela
tirada de um gráfico bioquímico
como se fosse uma ressonância magnética
dos turmores dessas gentes anti-matéria